SENTENÇA
PENAL E PROCESSUAL PENAL MILITAR. CONCUSSÃO. CONTRIBUIÇÃO REGULAR REALIZAD POR COMERCIANTES A POLICIAIS MILITARES. COMERCIANTES QUE ALEGAM CONTRIBUIR PARA A POLÍCIA MILITAR VOLUNTARIAMENTE DURANTE ANOS. PRÁTICA COSTUMEIRA. DÚVIDA QUANTO À EXIGÊNCIA DE VANTAGEM INDEVIDA. PROVA DUVIDOSA QUANTO AO NÚCLEO DO TIPO. DIVERGÊNCIA SÉRIA QUANTO AOS ELEMENTOS DE CONVICÇÃO. INVEROSSIMILHANÇA DA HIPÓTESE ACUSATÓRIA. INEXISTÊNCIA DE PROVA SUFICIENTE PARA CONDENAÇÃO. ABSOLVIÇÃO.
Vistos etc.
O Ministério Público Estadual, através de seu Representante legal, bem como no exercício de suas atribuições constitucionais e institucionais, com base em Inquérito Policial, ofereceu Denúncia em desfavor do acusado acima identificado por violação ao art. 305, diversas vezes, na forma do art. 80, ambos do Código Penal Militar.
Segundo narra o Ministério Público, o 3° Sgt PM PAULO HERÔNCIO DE LIRA fez do Destacamento Policial Militar/Delegacia Policial Civil de Lagoa Nova/RN um verdadeiro departamento de cobranças de taxas e valores totalmente descabidas e sem previsão legal. Registra que nos presentes autos a cobrança de R$ 100,00 (cem reais) anuais e R$ 20,00 (vinte reais) semanais a dono de casa de jogo para autorizar o seu funcionamento, de R$ 30,00 (trinta) reais anuais e R$ 2,00 (dois reais) semanais a donos de bares para autorizar os seus funcionamentos e de R$ 40,00 (quarenta reais) a donos de casas de shows e (estabelecimentos congêneres para autorizar a realização de festas e eventos. Confirma que o recebimento das respectivas quantias era feito ou diretamente pelo 3° Sgt PM PAULO HERÔNCIO DE LIRA ou por intermédio do Sd PM ODIVAM FERREIRA DE SANTANA, que, mediante o cumprimento de ordem manifestamente ilegítima do seu superior, fazia a coleta do dinheiro junto aos comerciantes locais semanalmente nos dias de sábado. Reforça que o Sd PM ODIVAM FERREIRA DE SANTANA contribuiu para que o 3° Sgt PM PAULO HERÔNCIO DE LIRA exigisse para si, diretamente, em razão de suas funções, vantagem indevida a comerciantes do Município de Lagoa Nova/RN, uma vez que fazia pessoalmente as cobranças e repassava o dinheiro arrendado ao referido Comandante do Destacamento de Policia Militar e Delegado de Polícia.
A Denúncia foi recebida, houve realização da prova testemunhal, dando-se oportunidade para o interrogatório.
Recebimento da denúncia em 18/11/08 (fls. 47).
Defesa ofertada com rol de testemunhas (fls. 52).
As partes apresentaram memoriais.
O Ministério Público requereu a condenação, fundamentando que a prova sinalizou no sentido de ter havido pagamento por parte dos comerciantes aos policiais (fls. 279).
A Defesa requereu a absolvição. Afirma que de acordo com as provas constantes dos autos, não existiu, de forma alguma, a conduta de "exigir vantagem indevida" por parte dos denunciados. Explora os depoimentos testemunhais para constatar que os acusados não fizeram exigência alguma aos supostos ofendidos e, pelo contrário, as verbas descritas na denúncia tinham caráter de contribuição e eram doados de forma espontânea. Sustenta que não há prova alguma de que as vítimas foram obrigadas, sob pena de algum mal, não havendo que não houve qualquer tipo de coação praticada contra as supostas vitimas. Nota que não houve constrangimento algum às supostas vítimas, o que foi, inclusive, por elas relatado, tendo ocorrido, apenas, contribuições diversas, de iniciativa dos próprios comerciantes, não tendo estes, em hipótese alguma, entendido como uma situação a configurar concussão ou qualquer constrangimento. Diz que para a caracterização de tal crime há, necessariamente, a exigência de que o agente atue em razão da função pública, pratique uma conduta comissiva de "exigir vantagem indevida" e no caso dos autos, não há comprovação alguma de que tenham os processados agido desta forma.
É o que importa relatar.
Decido.
FUNDAMENTAÇÃO
Nos termo do Art. 386, Código de Processo Penal, o juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça (VII) "não existir prova suficiente para a condenação".
Compulsando os autos processuais, entendo haver razão na afirmação de que não existem provas suficientes para condenação, porque não houve evidências suficientes que atestem a efetiva configuração do tipo em questão.
Em que pese a denúncia relatar conduta típica, os indícios do fato não autoriza deduzir que houve cabalmente a conduta descrita. É de se acatar que não existem provas suficientes que sustentem a autoria do crime.
A prova testemunhal não trouxe elementos que indicassem a formação de um juízo de certeza, mas, muito ao contrário, reforçam dúvidas.
Neste sentido, vamos à análise dos depoimentos.
O comerciante JOSE LUIS DOS SANTOS (fls. 94) disse que pagou durante um ano a quantia de R$ 2,00, semanalmente, a um policial (não soube informar o nome).
O comerciante JOSE ELIAS BARRETO (fls. 95) disse que pagou durante uns cinco anos a quantia de R$ 2,00, semanalmente, a um policial (salvo engano chamado Odivan); que à época do pagamento o delegado era Paulo Herôncio.
O comerciante TEOFILO DANIEL (fls. 96) disse que pagava a quantia de R$ 2,00, semanalmente; que certa fez pagou R$ 10,00 a Paulo Herôncio.
O comerciante JOSE MARTINS (fls. 97) disse que explorava banca de jogo de bicho; que pagava a quantia de R$ 20,00, semanalmente, durante mais de dez anos, arrecadada por Odivan Ferreira; que a taxa era cobrada, salvo engano, desde 1970.
O comerciante JOSE GUILHERME DA SILVA (fls. 98) disse que que pagava a quantia de R$ 2,00, semanalmente, a Odivan e no final do ano pouco mais; que Paulo Lira era o delegado de Polícia de Lagoa Nova; que Odivam nada dizia; que esse policia sempre ia fardado.
O comerciante MANOEL GONÇALVES DOS SANTOS (fls. 99) disse que pagava a quantia de R$ 2,00, semanalmente, durante quatro anos, espontaneamente, arrecadada por Odivan Ferreira; que à época o delegado era Paulo Herôncio.
Ficou claro que a contribuição natalina era espontânea.
O comerciante JOAO MARIA ACIOLE (fls. 100) disse que pagava a quantia R$ 30,00, a título de gratificação natalina; que Odivan pedia ajuda em nome do delegado, Paulo Lira; que nunca se sentiu coagido ou ameaçado pela polícia para dar essa ajuda.
O comerciante JOSE IVANALDO (fls. 1019) disse que pagava a quantia de R$ 30,00, no final do ano, a titulo de gratificação natalina; que colaborava espontaneamente.
O Cb PM RIVANILDO ALVES (fls. 102) disse que a cobrança da taxa era prática rotineira; que a taxa era em torno de R$ 1,00 a R$ 2,00; que a taxa servia para cobrir principalmente as despesas de alimentação dos policiais; que os próprios comerciantes acertaram entre si o pagamento da taxa para a polícia de Lagoa Nova/RN.
O PM JOSE CRISTIAN (fls. 103) disse que a cobrança da taxa era prática rotineira (que ocorria desde 1970, segundo informações); que outras cidades faziam o mesmo; que a taxa era em torno de R$ 1,00 a R$ 2,00; que a taxa servia para cobrir as despesas de alimentação dos policiais; que os próprios comerciantes acertaram entre si o pagamento da taxa para a polícia de Lagoa Nova/RN; que à época Paulo Lira era o Delegado.
FRANCISCO ERINALDO DE FREITAS (fls. 104) segue as linhas do depoimento acima, deixando claro que sempre era Odivam quem arrecadava o dinheiro. Em linhas gerais foi semelhante o depoimento de JOSE ODAILSON (fls. 105). Ambos dizem que a taxa cobrada era entre R$ 1,00 e 3,00.
O comerciante IRAILSON NOGUEIRA (fls. 106) disse que nunca se sentiu ameaçado ou constrangido em relação à contribuição que fornecia.
O comerciante JOSE ARAUJO (fls. 107) disse que ajudou a polícia durante uns vinte anos sempre que procurado, com aproximadamente R$ 1,00 ou R$ 2,00; que quando não tinha não dava.
ALDENIRA BENTA também confirmou que ajudou a polícia com a contribuição durante vinte e oito anos (fls. 109)
O comerciante JOSE DANIEL FILHO falou que contribuiu durante dez anos (fls. 110).
O comerciante MAURO BATISTA DE SOUZA (fls. 108) disse que ajuda de livre e espontânea vontade.
JOSE ROMUALDO disse que dava a qualquer policial que fosse buscar (fls. 111).
MARIA JOSE disse que o dinheiro era dado ao policial que fosse cobrar; que a taxa não era obrigatória (fls. 112).
Segundo os depoimentos, nenhum dos comerciantes recebeu recibo ou sabia as razões concretas de tal cobrança. Todos afirmavam que se tratava de uma prática comum realiza por eles havia algum tempo. Por outro lado, os próprios comerciantes afirmaram que o faziam espontaneamente.
O denunciado PAULO HERONCIO DE LIRA, disse
Que quando chegou já existia uma arrecadação de livre e espontânea vontade por parte do comércio; que o valor ficava a critério de cada comércia e arrecadavam em torno de R$ 50,00 a R$ 60,00 por sábado, que era o dia da feira; que o dinheiro era para alimentação (3 policiais por dia; 6 policiais eram de fora e se alimentavam na delegacia); que o dinheiro era para alimentação, material de expediente e até combustível; que não fez ofício a algum orgão solicitando providências; que a Prefeitura não prestava auxílio; que ODIVAM fazia a arrecadação; que passou quatro anos na função de delegado, de 2005 a 2009 (salvo engano) e arrecadou por uns três anos, até a reunião com o Ministério Público; que não havia prestação de contas do dinheiro arrecadado; que o comando nunca mandou ajuda e desde 1970 já havia uma ajuda no município; que não usou o dinheiro em seu proveito – 21min; que comunicou verbalmente o seu comandante e tinha conhecimento da arrecadação e que o Prefeito nunca havia passado nada.
O denunciado ODIVAM FERREIRA DE SANTANA disse
que é verdadeira a acusação; que existia uma repasse; que não exigia; que a contribuição era voluntária e nunca chegou a pedir ou forçar; que durou uns três anos essas contribuições; que os comerciantes se comprometeram por livre e espontânea vontade a repassar os valores; que o valor arrecadado era em torno de R$ 2,00 de cada comerciante, todo sábado; que o valor total era aproximadamente de R$ 50,00 a R$ 60,00 e era repassado ao Sargento; que a ordem foi de determinação do superior para ir arrecadar o dinheiro; que repassa o valor ao Sargento Herôncio; que quando chegou na cidade o dinheiro já vinha sendo arrecadado; que o repasse terminou depois de uma reunião com o promotor; que não fazia arrecadação de casa de jogos; que não arrecadava por ano; que provavelmente o TEOFILO DANIEL não é muito chegado a ele – 37min (não menciona motivo claro e diz que já teve tirá-lo de algumas situações); que a verba era empregado em benefício da delegacia; que deram andamento a este costume na cidade.
Não entendo ser a hipótese de dizer que o fato não existiu, mas que não existem provas suficientes para a demonstração da conduta típica. O delito de concussão depende da comprovação de que o agente exigiu, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, em razão da função exercida, vantagem indevida. A conduta consiste em exigir, impor como obrigação, devendo dessa forma estar demonstrado que o agente impôs temor à vítima ao menos indiretamente.
Na situação, existem dúvidas se os militares utilizaram de suas funções para impor a alguma contribuição às vítimas, não havendo prova cabal de que elas foram obrigadas a fazer doações semanais/mensais para a polícia militar durante vários anos.
Vários comerciantes que prestaram onfirmaram a voluntariedade do ato, que vinha sendo praticado havia anos, inclusive com a possível anuência do delegado local. O comerciante MANOEL GONÇALVES DOS SANTOS (fls. 99) disse que pagava espontaneamente. O comerciante JOAO MARIA ACIOLE (fls. 100) disse que nunca se sentiu coagido ou ameaçado pela polícia para dar essa ajuda. O comerciante JOSE IVANALDO (fls. 1019) disse que colaborava espontaneamente. O Cb PM RIVANILDO ALVES (fls. 102) e PM JOSE CRISTIAN (fls. 103) disseram que os próprios comerciantes acertaram entre si o pagamento da taxa para a polícia de Lagoa Nova/RN.
Nesta mesma linha, o comerciante IRAILSON NOGUEIRA (fls. 106) disse que nunca se sentiu ameaçado ou constrangido em relação à contribuição que fornecia. O comerciante MAURO BATISTA DE SOUZA (fls. 108) disse que ajuda de livre e espontânea vontade. JOSE ROMUALDO disse que dava a qualquer policial que fosse buscar (fls. 111) e MARIA JOSE disse que o dinheiro era dado ao policial que fosse cobrar; que a taxa não era obrigatória (fls. 112).
Ainda que tenham dito os comerciantes que a prática era voluntária, não podemos pensar que os fatos são exatamente como eles disseram, mas existem muitas dúvidas quanto à efetiva exigência. Ficou duvidoso se a contribuição era de fato espontânea ou se decorria de uma postura de imposição implícita ou se havia cooperação ilícita de ambos os lados (comerciantes e policiais).
Para reforçar dúvidas, destaco que se tratava de uma prática costumeira no município, o que pode de alguma forma sugerir a voluntariedade. Neste sentido, JOSE MARTINS (fls. 97) disse que a taxa era cobrada, salvo engano, desde 1970. O comerciante JOSE ARAUJO (fls. 107) disse que ajudou a polícia durante uns vinte anos sempre que procurado e que quando não tinha não dava. ALDENIRA BENTA também confirmou que ajudou a polícia com a contribuição durante vinte e oito anos (fls. 109). O comerciante JOSE DANIEL FILHO falou que contribuiu durante dez anos (fls. 110).
Segundo a jurisprudência castrense, o tipo objetivo consiste na conduta típica exigir, impor como obrigação, aproveitando-se o agente do temor de represálias a que fica submetida a vítima:
APELAÇÃO CRIMINAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL MILITAR. CONCUSSÃO. PROVA TESTEMUNHAL. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. FALSIDADE IDEOLÓGICA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO PARA A ADMINISTRAÇÃO OU SERVIÇO MILITAR. INEXISTÊNCIA DE DANO NA ESFERA PÚBLICA E PRIVADA. CONDUTA ATÍPICA. APELO DESPROVIDO. 1. O delito de concussão, tipificado no artigo 305 do Código Penal Militar consiste em exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, em razão da função exercida, vantagem indevida. O tipo objetivo consiste na conduta típica exigir, impor como obrigação, aproveitando-se o agente ativo do temor de represálias a que fica constrangida a vítima. 2. No caso dos autos, não restou plenamente evidenciado que os militares utilizando-se de suas funções, impuseram às vítimas um constrangimento tal, que as obrigassem a efetuar doações para a reforma do destacamento de polícia militar local, para que aqueles não impusessem uma sanção administrativa. 3. Diante da prova testemunhal produzida não restou devidamente provado que os recorridos tenham exigido vantagem indevida, condição essencial para a configuração do delito de concussão, não sendo possível emitir um juízo condenatório. ... 6. Apelo desprovido. Unânime. (TJ-ES; ACr 24040142804; Segunda Câmara Criminal; Rel. Des. Subst. Ubiratan Almeida Azevedo; DJES 10/10/2011; Pág. 82).
Diante da dúvida quanto à prática delitiva, deve ser determinada a solução absolutória:
APELAÇÃO CRIMINAL. INCONFORMISMO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. RÉU POLICIAL MILITAR, ABSOLVIDO DA ACUSAÇÃO DA PRÁTICA DO CRIME DE CONCUSSÃO (ART. 305. CPM). ALEGADA SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA PARA IMPOR CONDENAÇÃO AO RÉU. IMPROCEDÊNCIA. DEPOIMENTOS CONTRADITÓRIOS E INCOMPROVADOS. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. INCONSISTÊNCIA DA ACUSAÇÃO. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 155, 197 E 386, VII, TODOS DO CPP. CONDENAÇÃO INVIABILIZADA. DECISÃO ABSOLUTÓRIA MANTIDA. RECURSO MINISTERIAL IMPROVIDO. Ressaindo dos autos, sobretudo pela contradição da prova oral encartada nos autos, conjunto probatório frágil, fomentando dúvida acerca da autoria delitiva, impõe-se a aplicação do princípio in dubio pro reo, mantendo-se a absolvição do réu com fulcro nos arts. 155 c/c 197 c/c 386, VII, todos do CPP. (TJ-MT; APL 20275/2011; Capital; Segunda Câmara Criminal; Rel. Des. Teomar de Oliveira Correia; Julg. 07/03/2012; DJMT 15/03/2012; Pág. 90).
Mesmo sentido:
RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL. POLICIAIS MILITARES DENUNCIADOS PELA PRÁTICA DO CRIME DE CONCUSSÃO, PREVISTO NO ART. 305 DO CÓDIGO PENAL MILITAR. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. INCONFORMISMO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. IMPROCEDÊNCIA. CONTRADIÇÃO NOS DEPOIMENTOS DA VÍTIMA E TESTEMUNHAS. IN DUBIO PRO REO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DA INOCÊNCIA. DESPROVIMENTO DOAPELO. DECISÃO MANTIDA. Diante da dúvida quanto à prática delitiva, deve ser mantida a sentença absolutória com fulcro no art. 439, alínea "e", do Código de Processo Penal Militar e em respeito ao princípio constitucional da presunção da inocência, insculpido no inciso LVII do art. 5º da Constituição Federal, que positivou a primazia do brocardo jurídico in dubio pro reo. (TJ-MT; APL 27440/2009; Capital; Terceira Câmara Criminal; Rel. Des. Luiz Ferreira da Silva; Julg. 03/08/2009; DJMT 12/08/2009; Pág. 34).
Somente elementos de prova seguros, resistentes ao contraditório da parte diversa, são aptos a justificar o juízo de certeza necessário para a condenação, do contrário terá lugar a absolvição em respeito ao in dubio pro reo.
Como explica Ferrajoli, para haver condenação, deve haver prova e refutação da contraprova e, dessa forma, quando não são refutadas a prova e a contraprova, a dúvida se resolve pelo princípio in dubio pro reo (FERRAJOLI, Luigi. "Direito e Razão: Teoria do Garantismo Penal". Trad. Ana Paulo Zomer, Fauzi Hassan Choukr, Juarez Tavares e Luiz Flávio Gomes. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 122).
Inexiste nos autos processuais elementos que comprovem com certeza a autoria delitiva.
O sistema processual brasileiro não veda a existência do testemunho indireto, dado que a fundamentação da decisão será conforme o princípio do livre convencimento, mas nunca será possível um julgamento baseado exclusivamente em provas pré-processuais ou provas processuais colhidas por meio de testemunhos indiretos. Em regra, a decisão não poderá ser fundamentada com base em provas pré-processuais, exceto os casos legais, conforme o art. 155, CPP (o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas).
Na situação em questão, vale a jurisprudência:
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. MENOR. AUSÊNCIA DE PROVA DA MATERIALIDADE. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. Deve prevalecer a sentença absolutória, quando a acusação não traz aos autos provas irrefutáveis da materialidade do crime imputado ao acusado. Ainda que haja indícios de que o acusado tenha praticado o delito, tais indícios, em que pese seu reconhecido valor de prova indireta, não encontrando amparo no conjunto probatório, não autorizam uma condenação. Apelo desprovido. (TJ-DF; Rec. 2006.02.1.000102-5; Ac. 410.196; Primeira Turma Criminal; Rel. Des. Mario Machado; DJDFTE 07/04/2010; Pág. 163).
CONCLUSÃO
PELO EXPOSTO, diante do que foi analisado, concernente ao conjunto probatório, absolvo PAULO HERONCIO DE LIRA e ODIVAM FERREIRA DE SANTANA, no sentido de que não existem provas suficientes que sustentem a prática dos fatos imputados na denúncia, nos termos do art. 439, "e", do Código de Processo Penal Militar.
Publicações e intimações. Registre-se.
Após, arquive-se com a devida baixa na distribuição.
Natal, 13/09/2012
FÁBIO WELLINGTON ATAÍDE ALVES
Juiz de Direito Auxiliar na 11ª Vara Criminal
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