Torre de babel judiciária está em vias de demolição
Está em vias de demolição uma das mais antigas construções conhecidas: a torre de babel judiciária brasileira.
A diminuição, em 40%, do número de ações nas duas principais Cortes do país — o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça — não chamou muita atenção. Mas vai sacudir muitos costumes quando a correia de transmissão do
sistema chegar na primeira instância. A Justiça deixará de ser um esconderijo tranquilo para caloteiros e outros finórios.
As ferramentas da demolição chamam-se efeito vinculante, repercussão geral e a lei que breca recursos repetitivos. Em português claro: o julgamento de uma causa passa a valer para todos os casos iguais; o Supremo deixa de ser quarta
instância e escolhe as causas mais relevantes para julgar e oferecer como modelo a ser seguido. O STJ passa a desautorizar os sucessivos recursos quando já se sabe o desfecho do caso.
O vaticínio pode parecer otimismo de apostador. Mas o equacionamento do sistema é lógico demais para ser ignorado. Ao jogar luzes sobre temas e não apenas sobre os litígios, os juízes racionalizam a estrutura. O “Anuário da Justiça 2009”, que acaba de ser lançado pela ConJur Editorial, mostra que os estimados 60 milhões de processos que transitam pelas mãos dos juízes brasileiros resumem-se a 2.400 discussões. Resolvidas essas discussões, resolveram-se os 60 milhões de processos. É esse o espírito da coisa.
É claro que essa obra tem muitos engenheiros. O ministro Cesar Asfor Rocha, primeiro como corregedor do CNJ e agora como presidente do STJ faz sua parte. Mas a turbina é Gilmar Mendes, formulador de soluções que esculpe há quinze anos e agora, como presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tem a oportunidade de implementar.
Algumas fórmulas em curso são óbvias. Em vez de ganhar um número a cada movimentação, o processo vai nascer e morrer com a mesma designação. Mais que isso: a numeração nacional será unificada. O novo número informará de onde é o processo e qual a sua natureza. Permitirá estatísticas exatas e instantâneas para orientar o gerenciamento da parte dos tribunais. As partes serão cadastradas pelo CPF ou pelo CNPJ para acabar com o isolamento atual em que um estado, um tribunal ou ramo da Justiça nada sabe do que ocorre no vizinho. Em miúdos: será possível saber se algum dos litigantes está usando o Judiciário indevidamente.
No aspecto gerencial, o CNJ emerge como uma surpresa agradável para quem temia que o órgão se firmasse como uma delegacia policial para reprimir juízes. O Conselho está criando paradigmas administrativos para substituir a autonomia
perniciosa dos tribunais.
Aquele tipo de regrário em que cada dirigente — e juízes em geral são péssimos administradores — rege o tribunal como quer e tudo muda a cada gestão. Os feudos devem acabar. Depois de tantos anos de discursos vazios e adjetivos, o próprio Judiciário encontrou o seu caminho. Quem só reclamou até agora, tem a chance de ajudar
apoiando esse mutirão.
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[Artigo originalmente publicado na edição desta segunda-feira (11/5) do jornal O Globo]
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