6 07 2008
Nas próximas semanas, o banqueiro Cacciola chegará ao Brasil para iniciar o cumprimento de sua pena. Já no centro de triagem, o carcereiro deverá perguntar ao ilustre prisioneiro: o Sr. Cacciola prefere uma cela para não fumantes? Ops! não vamos esperar muita educação dos carcereiros brasileiros, mas ao menos ao nosso visitante deveriamos assegurar-lhe os direitos de uma tal Lei de Execução Penal. Mas também não esperem que lhe dêem uma prisão com vista para o mar.
O sistema prisional humanista é uma novidade ocidental que ainda não completou dois séculos. Como são humanos esses humanos.
No séc. XXI, a prisão carcerária virou uma espécie de diploma da decadência da civilidade. Guantánamo - e o governo de Fidel - vão ficar para a história como a última prova de nossa decadência moral. Como são atrasados esses macacos urbanos…
Platão, quatro séculos antes do advento do humanismo cristão, criticava a democracia por ser um regime onde os prisioneiros desfilavam como se fossem heróis (A República). Heróis é a palavra. Marquem bem.
Cacciola teve a felicidade de ter sido preso em Monáco. Como noticiou a coluna de Mônica Bergano (Folha de São Paulo, 24.03.08, E2), o banqueiro, embora detido, tem acesso a sala de ginástica, biblioteca e outras conquistas do mundo civilizado, como um ambiente para não fumantes. Antes de ocupar o seu apartamento prisional com vista para o mar, Cacciola teve a opção de escolher uma cela para não fumantes. Isso é uma prisão no principado mais chic do pedaço.
Fico imaginando como deve ter sido a recepção de Cacciola lá em Monte Carlo. Educadamente, o guarda penitenciário - bem vestido, salário atualizado e gel na cabeleira cinematográfica - perguntou ao cidadão italiano se ele desejava uma cela para fumantes ou não fumantes.
Esse tipo de cena não nos é comum nem em muitos restaurantes brasileiros. Explico. Ainda não é habitual no Brasil espaços para não fumantes. Todos os países do mundo já se apressam em editar leis que proíbem o fumo em locais públicos. Recentemente, a Cidade do México proibiu que se fume em locais públicos. Isto é que é civilização.
Não me importam os índices de desenvolvimento humano ou aqueles indicadores econômicos que tentam demonstrar o quanto o país está desenvolvido. A cada dia, vejo reportagens que confirmam o aumento do consumo das classe de A a Z.
As nossas classes socias não estão apenas morrendo de dengue, mas continuam consumindo muito … muito poucos livros. Uma coisa tem a ver com a outra. Precisamos urgentemente de um bolsa-leitura. Jogo no lixo todas aquelas explicações acadêmicas sobre nosso crescimento.
Duvido de quem defenda o advento da civilização pensante no Brasil, enquanto tolerarmos o ato de fumar em praça pública (isto é uma expressão meramente metafórica), enquanto continuarmos exibindo o cigarro como um troféu, enquanto o fumante for visto como um herói social (isso é culpa do cinema, não de Platão)…
A prisão onde está Cacciola é fruto da democracia (e isto é “culpa” de Platão!). Diga-se, além do mais, que Platão era crítico do modelo democrático; preferia acreditar que a felicidade dependia da LEI E ORDEM.
Cacciola perdeu o seu Recurso à Corte Européia de Direitos Humanos, mas ele ainda pretende pleitear uma indenização milionária do governo brasileiro. Isso pode se dar por falta de celas para não fumantes (brincadeirinha…).
Realmente, Guantánamo não parece tão ruim assim, perto de nossas prisões, que em muitos casos reproduzem os calabouços fétidos da idade média. Cacciola, coitado, merece a dádiva da civilidade dos direitos humanos. Nenhuma corte de direitos humanos seria capaz de entregar um de seus filhos bem-nascidos a um bando de “canibais corruptos” (expressão meramente metafórica), cujas prisões sequer reservam lugar para não fumantes.
Platão fazia uma associação entre o individuo e a sociedade , mostrando que a sociedade tem o individuo que merece. É isso mesmo. Para Platão, o bem é aquilo que nos faz progredir e o mal é o que destrói. Uma sociedade que tolera o cigarro não mata apenas a seus cidadãos, mas destrói a si mesmo. Continuamos sendo autofágicos, como antes do descobrimento. Ou, aliás, nós ainda não nos descobrimos…
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