CRIME MILITAR – SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE OU
QUE DETERMINE DEPENDÊNCIA FÍSICA OU PSÍQUICA – REGÊNCIA ESPECIAL. O tipo
previsto no artigo 290 do Código Penal Militar não requer, para configuração, o
porte de substância entorpecente assim declarada por portaria da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária
RHC N. 98.323-MS
RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO
CRIME MILITAR – SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE OU
QUE DETERMINE DEPENDÊNCIA FÍSICA OU PSÍQUICA – REGÊNCIA ESPECIAL. O tipo
previsto no artigo 290 do Código Penal Militar não requer, para configuração, o
porte de substância entorpecente assim declarada por portaria da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária.
*noticiado no Informativo 657
Vejam outros dois casos que confirmam este rigor:
Cola de sapateiro e crime militar
A 1ª Turma negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus
no qual se pretendia trancar ação penal sob a alegação de que a Lei 11.343/2006
não classificaria a cola de sapateiro como entorpecente. No caso, o recorrente,
militar preso em flagrante no interior de estabelecimento sujeito à
administração castrense, fora surpreendido, sem apresentar capacidade de autodeterminação,
inalando substância que, conforme perícia, conteria tolueno, solvente orgânico
volátil, principal componente da cola de sapateiro.
Reputou-se que deveria ser observada a regência especial da matéria e,
portanto, descaberia ter presente a Lei 11.343/2006, no que preceituaria, em
seus artigos 1º e 66, a
necessidade de a substância entorpecente estar especificada em lei. Incidiria , assim, o disposto no art. 290 do CPM (“Receber,
preparar, produzir, vender, fornecer, ainda que gratuitamente, ter em depósito,
transportar, trazer consigo, ainda que para uso próprio, guardar, ministrar ou
entregar de qualquer forma a consumo substância entorpecente, ou que determine
dependência física ou psíquica, em lugar sujeito à administração militar, sem
autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”).
RHC
98323/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 6.3.2012. (RHC-98323)
APELAÇÃO DEFESA.
PRELIMINAR. APLICAÇÃO DA LEI N.º 11.343/2006. REVOGAÇÃO. ARTIGO 290 DO CPM.
MÉRITO. PORTE DE ENTORPECENTE. ÁREA SOB ADMINISTRAÇÃO MILITAR. PRINCÍPIOS DA
SOBERANIA, DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E INSIGNIFICÂNCIA. ESPECIALIDADE DA
LESGILAÇÃO PENAL MIITAR. ATIPICIDADE DA CONDUTA. DUE PROCESS OF LAW. AUSÊNCIAS
DO AUTO DE APREENSÃO E DA MATERIALIDADE DO DELITO. 1. O artigo 290 do Código
Penal Militar, a despeito das notórias e anacrônicas deficiências, continua em
pleno vigor, sendo compatível com a previsão legal de aumento de pena, do
artigo 40, III, da Lei nº 11.343/06, para o caso específico de tráfico de
entorpecentes, ficando excluído o autor do delito que porte consigo a droga,
para uso pessoal. 2. A soberania (art. 1º, inc. I, da CF) é a própria razão de
ser das Forças Armadas e condição sine qua non para o respeito à dignidade da
pessoa humana, do pluralismo político, da cidadania, dos valores sociais do trabalho
e da livre iniciativa, conforme o art. 170 da Constituição Federal. 3. Sem que
o Estado Brasileiro seja soberano, o respeito à própria Carta Constitucional
torna-se inviável. O que significa que, sem soberania, é impossível a
consecução de qualquer modelo de Estado, seja simplesmente de
"Direito", "Democrático de Direito", "Social de
Direito", ou mesmo "totalitário". Trata de conclusão lógica que
não remete a maiores considerações. 4. No
sistema de Direito Penal Militar o fundamento da dignidade da pessoa humana,
diferentemente do sistema de Direito Penal Comum, tem sua aplicabilidade
condicionada e, de certa forma, mitigada, pelo fundamento da soberania. Tanto é
assim que a Lei Penal Militar pune a deserção, a insubmissão, o abandono de
posto e até a conduta de dormir em serviço, citando-se apenas os crimes
propriamente militares em tempo de paz. 5. Em razão do princípio
fundamental da Soberania, não há como afastar a especialidade do Direito Penal
Militar em razão da Lei Penal comum, ainda que mais benéfica. Ante a
especialidade do Direito Penal Militar, o Legislador deveria, caso fosse seu
intento aplicar a Lei antidrogas no ambiente castrense, fazê-lo expressamente,
haja vista que o ato de portar drogas no âmbito do exercício das funções das
Forças Armadas, não é, nem nunca foi, hipótese igual ao ato de portá-las no
meio civil. 6. Não se pode afirmar que tão-somente pelo fato de o respeito à
dignidade da pessoa humana ser princípio fundamental do Estado Democrático de
Direito deva ser aplicado e utilizado de forma descompassada, em todas as
situações, a ponto de se contradizer com toda a lógica do sistema. Deve-se ter
em conta que a soberania do Estado Democrático de Direito, materializada na
higidez de suas tropas, está também em jogo, revelando-se antijurídica a adoção
indiscriminada da legislação comum sobre drogas nos casos de porte dentro de
nossos quartéis. 7. A traficância e o porte de drogas na caserna não podem
ser tratados da mesma maneira que o são pelas instituições criminais da
sociedade civil. Deve-se refletir se a soberania do Brasil não estaria
comprometida caso a tropa fosse constituída de grande número de viciados. Pondere-se,
também, se seria seguro colocar um fuzil ou metralhadora sob a responsabilidade
de um usuário habitual de "crack" ou "ecstasy". 8. O
princípio da especialidade da Legislação Penal Militar, tendo em vista que se
fundamenta na soberania do Estado Democrático de Direito, valor colocado por
nossa Constituição na mesma hierarquia da dignidade da pessoa humana, é por esse
inafastável. Preliminar rejeitada, por unanimidade. 9. Para que se tenha como
provada a materialidade do delito do art. 290 do CPM, não deve haver dúvida
quanto à capacidade lesiva da substância apreendida ao bem jurídico
"saúde", a fim de que a conduta apresente tipicidade material. 10. A
não obediência aos ditames do due process of law, por ausência do auto de
apreensão, desrespeita o disposto no artigo 189, caput e parágrafo único, do
Código de Processo Penal Militar e leva à absolvição do acusado, haja vista a
ausência de prova da materialidade do delito. 11. Deve-se adotar o princípio da
insignificância quando a substância apreendida é tão insignificante que sequer
sobrou para ser pesada. Recurso conhecido e provido, por maioria. (Superior
Tribunal Militar STM; APL 2007.01.050641-1; Rel. Min. Flávio Flores da Cunha
Bierrenbach; Julg. 12/02/2009; DJSTM 19/01/2010).
CPM, art. 290 LEI 11343, art. 40 CF, art. 1
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