Em que está dando o ação propostas contra a estudante de direito que manifestou seu ódio a nordestinos? Falo de Mayara Petruso e todos os outros que se ocupam desse passa-tempo na net.
Já sugeri outras dicas de leitura à menina. Será que ela terminou o curso com a cabecinha mais aberta?
Bem, hoje vou indicar outra leitura. Especial para quem deve entender os processos de formação das ideias de racismo interno.
Como estou me referindo aos alunos de direito, vamos a um livro que é uma aula.
Os anormais, de Foucault, parece a leitura perfeita para quem pretende entender os processos de formação das ideias racistas.
Nestas aulas, Foucault deixou-me de queixo caído. É daqueles livros fenomenais, principalmente porque se trata apenas de aulas proferidas no Collège de France (no ano de 1975). A informalidade faz o texto correr solto; pareceu-me que estava diante do próprio autor de Vigiar e Punir. Emocionante!
Teria muito para falar sobre livro. Vou deixar para a sala de aula.
Vou tentar fazer uma explicação rápida e resumida para racistas e preconceituosos. O que Foucault propõe é explicar o processo de judicialização da psicanálise. Para tanto, ele parte da idade média. Toma como ponto de partida o que chamou o modelo de exclusão de leprosos. Já neste início o livro está pago. E se paga mais ainda com a explicação da expansão do modelo de leprosos, o que ocorre no séc XVII.
Quem não gosta de leitura, será tentado a ficar por aqui.
Insisto. Continuem até pelo menos entenderem o fim do modelo de exclusão dos leprosos e o surgimento do modelo de
“inclusão de pestífero” (higienização). Aqui você já sai no lucro. Mais o livro somente está começando. Já vai aí um tempo de leitura detalhada e releitura de partes mais atrativas.
Começamos a nos aproximar do coração. O surgimento das
“Tecnologias positivas de poder”. A reação negativa, de exclusão, e agora, o
controle positivo (da peste) “proativo”. Alcançamos o primeiro degrau.
Daí é um passo para entendermos o modelo de “inclusão de pestífero”, lá no fim
do séc. XIX – higiene pública. Ocorre assim a expansão do modelo para outras
formas de excluídos, não havendo mais uma demarcação rígida sobre quem será excluído. O racista
queima o livro nesta parte. Estamos chegando perto de Hitler. É afinal como
entendemos por que há uma necessidade estatal de um controle politico muito
maior. Vêm novas exigências e característica do modelo de peste, aliadas às “tecnologias
positivas de poder” e classificação dos indivíduos. Coitado de Lombroso. Ficou
pequeno perto de Foucault. Lombroso, apropósito, tem dois livros fundamentais
para compreender este pensamento. Depois falaremos dele.
O que Foucault explora é a separação entre normais e doentes e os processos de intervencao
para tratamento deste último por meio de uma psiquiatria para a higiene. Ufa. A
esta altura as aulas estão efervescendo. Será que tem algum racista faltando a
elas? Somos então apresentados ao médico, a família e ao juiz. Todos estão unidos para controle do novo perigo e para tanto recorrem ao novo
poder, cujas principais características são:
Não repressivo, mas produtivo; poder
ligado a um saber; poder que não é da superestrutura.
Já sabemos então que há em andamento um novo papel do saber
psiquiátrica e que no Estado mais haverá
desperdício de violência. O controle será racionalizado com base em um saber
científico!
O fim do séc 18 marca a interligação entre o criminoso e o patológico. O
julgamento do criminoso será conforme não
o crime (fato) mas sim conforme a sua avaliação de normal ou patológico
(sujeito). Neste processo, o autor aborda três elementos que serão absorvidos
no sec. 19: a) grande Monstro (humano);
b) individuo a ser corrigido (criança indócil) e o Pequeno Masturbador.
Chegamos ao centro do livro. Mas acredite, daqui pra frente ainda há coisa
melhor.
Explorando o nascimento do anormal no seio da família
burguesa, Foucault mostra como a família passa a agir como intermediária da
psiquiatria para dominar corpos, controlando a sexualidade. A nova psiquiatria assume preocupações com o
desvio, as anormalidades. Vai se ocupar de síndromes e de uma gente que não tem
qualquer doença (cleptomaníacos, incendiários, exibicionistas, masoquistas etc).
Para mim, o ápice do livro está na explicação do surgimento da noção de estado (condição). Aqui, "estado" não é doença e não se confunde com a
predisposição. Estado é uma base causal para doenças. É uma característica
geral e estrutural do indivíduo. Torna-se assim importante o estudo da
hereditariedade do indivíduo. No estudo da hereditariedade do indivíduo, o
indivíduo carrega o corpo dos ancestrais. Quem possui um estado não será
considerado normal.
A estudante, como todos os
racistas, estão presos a esta forma de pensar. Idiotas os que pensam assim.
Digo idiotas no sentido político, por que esquecem que eles mesmos podem ser
objeto do “estado”. Por que? Porque o estado pode produzir “qualquer coisa, a
qualquer momento e em qualquer ordem”. Qualquer desvio ou transgressão do
indivíduo pode ser atribuído a um estado. No estudo da hereditariedade, uma
doença de certo tipo nos ancestrais pode causar qualquer doença.
Saindo do livro. Vejam Rodolph
Giuliani. O ex-prefeito de Nova York, um dos que foi um atuante dominador
contra aquelas minorias possuidoras de estado. Pois bem. O pai dele já fora
condenado por crime de roubo contra um leiteiro e chegou a cumprir pena. Giuliani
nasceria depois deste episódio revelador de estado, tendo tomado conhecido
disto somente quando era prefeito de NY. Tristeza... Logo o pai, a quem ele
tanto admirava. Os racistas sempre armam ratoeiras para eles próprios.
E quais as consequências da noção de estados? Não há sentido para a busca da cura de ninguém; a pena não precisa ressocializar; não há utilidade para a terapia; a sociedade deve ser protegidos dos agentes anormais; a psiquiatria surge como um tecnologia poderosa de poder determinando que é anormal.
Fica assim explicado como surge um novo racismo em oposição
ao racismo tradicional. Surge o racismo contra os portadores de estado
(estigmas). É um racismo interno, entre os próprios membros do grupo. O nazismo
faz uma ligação entre o racismo tradicional (por ex. antissemita) e o novo
racismo
***
Aqui eu sugiro que o leitor pare e leia Garland, A Cultura
do Controle (Revan). David Garland vai explicar justamente como ocorre nos EUA
a desconstrução da criminologia correcionalista, ajudada por uma crítica à rotulção. Já falei disso neste blog várias vezes. Depois volto a Garland.
Também indico a leitura do meu próprio livro, que faz uma
abordagem da evolução da teoria da Defesa Social e da Nova Defesa Social. Enquanto Garland foca o eixo EUA-UK, segui as mesmas ideias
dando preferência ao eixo europeu de ideias.
***
Segunda-feira começam as aulas... Até lá e boa leitura....Cabeça aberta!
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Vamos à notícia recente da ação proposta no ano passado contra a aluna citada:
Justiça Federal processa estudante por tuitar contra nordestinos
da Redação do Terra Magazine
02/06/2011
A Justiça Federal de São Paulo divulgou, nesta quinta-feira (2), que abriu processo, em 4 de maio, contra a estudante de Direito Mayara Penteado Petruso pelo crime de racismo. A denúncia havia sido oferecida na véspera pelo Ministério Público Federal. Logo após o anúncio da vitória eleitoral de Dilma Rousseff (PT), em 31 de outubro de 2010, Mayara publicou no Twitter “mensagem de incitação à discriminação ou ao preconceito de procedência nacional”. Em depoimento ao MPF, ela admitiu que escreveu os comentários na rede social.
- Nordestino não é gente, faça um favor a SP, mate um nordestino afogado! – tuitou.
O crime de racismo prevê pena de 1 a 3 anos de prisão e multa, porém, se cometido mediante uso de meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza, como no caso da estudante paulista, a pena prevista é de 2 a 5 anos de prisão e multa.
Até o poder judiciário receber a denúncia, o caso tramitou em segredo para preservar o conteúdo das quebras de sigilo telemáticas que averiguavam as operações de Mayara no perfil de Twitter denunciado. Várias pessoas e entidades haviam reportado ao MPF textos racistas na ocasião.
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