domingo, 10 de abril de 2011

Bolsonaro sabe do Segredo de Brokeback Mountain: uma crítica

O Segredo de Brokeback Mountain trata-se de um filme que dramatiza um romance homossexual nos EUA entre 1963 e 1981. Premiado em vários festivais, está entre os filmes românticos de drama com maior bilheteria já registrada.
Faço questão de observar que o filme ajuda a compreender o problema criminológico. Para tanto, devemos situar que o  romance passa justamente numa época na qual está em andamento um atrito fundamental para a criminologia. 
Que atrito é esse? Para responder à indagação, vou me socorrer muito de Jock Young, para começo de história.
Bem, o filme está de fato retratado numa época de glória para as estruturas sociais. Somos convidados a visualizar um sério questionamento aos valores estabelecidos, especialmente a família e o trabalho, instituições que deram suporte ao American Dream  [claramente visualizados no  relacionamento entre os dois cowboys].
E Bolsonaro  está fincado justamente aqui. Neste instante mágico para a criminologia, quando os valores estabelecidos começam a sofrer degradação. A idade do deputado sugere muito. Ele nasceu em 1955 e teve o desenvolvimento de seus valores voltado a um modelo de sociedade em crise!
O filme mostra o momento crucial  em que família, trabalho, economia, política e educação estão harmonicamente estruturados para cumprir funções, mas esse sonho de uma vida perfeita chega ao seu fim, não apenas para os cowboys, mas para a sociedade. Já pensando em outras leituras, vemos aqui que o filme se passa numa época em que a sociedade se submete às estruturas, determinante dos papéis sociais. Bolsonaro nasce em meio a valores segundo os quais os homens cumprem papéis voltados ao trabalho e não ao afeto. A inversão do afeto e do trabalho ou, dizendo de outro modo, a inclusão do afeto em meio ao trabalho dos homens põe a vida  de ponta a cabeça.
É dessa forma que pensa Bolsonora. A sua “cabecinha”  está fixa à ideia cuja fragilidade vem a ser exposta pelo filme.  Portanto, claramente observamos que o deputado representa muito bem os valores questionados pelo romance homossexual. 
Contudo,  os valores estabelecidos e defendidos por Bolsonaro dependem justamente da “promiscuidade” retratada pelo filme e vista na sociedade de hoje, para usar uma palavra bem dele. Aparentemente de forma contraditória, é  “a libertinagem geral” que assegura ouvido e votos ao deputado... As ideias de Bolsonaro tão teriam muito tempo de vida se não fosse o novo ideal social. 
No fim da década de 1960, entram em crise os valores encabeçados pela família e trabalho, porém esses valores não deixaram de existir completamente; as estruturas que deram base a eles no passado ainda existem e é em favor delas que surge a opção tomada pelo deputado. 
A questão central é que Bolsonaro nega a mudança. A criminologia clássica também. Desconfio que ele, assim como os criminólogos clássicos, devem entrar em um conflito existencial dramático. O próprio deputado chegou a defender a “retomada da ditadura”, aqui simbolicamente representativa dos valores anteriores à revolução sexual.
A revolução sexual não somente abala a família. Com mais um pouco de leitura, seremos capazes de compreender que a função afetiva da família passa a ter uma dimensão inclusiva nunca antes vista. 
Desde a década de 1970 e até hoje, chegamos então ao momento da "derrocada das estruturas," tomadas que são pelo pensamento funcional. Isso mudará a cara do fenômeno crime.  O Direito Penal chega então para cumprir funções constitucionais e para tanto pode até passar por cima das estruturas socais antiquadas.
Por sua vez, a mulher deixa de ocupar o espaço exclusivo da família e vem se alojar justamente no local cativo dos homens: o trabalho. Os homens revidam, evidentemente, o que, de certa forma, justifica ações afirmativas e políticas de proteção de gênero.
Finalmente, concluímos que Bolsonora tem todo direito de pensar em um passado, mas que isso seja compreendido como uma ótica inócua aos novos problemas, inteiramente desvalida. A sua opção de pensar deve limitar a ele próprio apenas. É um homem que está só diante da ciência.

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