quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Trecho de termo de audiência em Caicó. Memoriais (trecho de termo de audiência do Juiz André Melo - Caicó/RN)

Em seguida, foi concedida a palavra ao Dr. Raimundo Cezario de Freitas, que levantou questão de ordem nos seguintes termos:
"MM Juiz, considerando a complexidade do caso, face ao número de acusados, à quantidade de testemunhas e declarantes ouvidas, inclusive em depoimentos gravados em audiovisual, o que dificulta em muito a análise do processo, haja vista o calhamaço de provas contidas no bojo dos autos, prejudicando o direito dos acusados Fábio de Lima Ferreira e Antônio Nuclécio de Morais que os defendo, bem como o avançado da hora, pois já são 21:45, tendo a audiência iniciado às 10 horas da manhã, o que causa cansaço e fadiga para analisar as minúncias e os detalhes dos autos. Insto posto a apresenta das razões finais em forma de memoriais nos termos do art. 403, parágrafo terceiro do CPP. Pede deferimento. "
Pelo MM Juiz de Direito foi dito:" Para análise do requerimento da Defesa de dois acusados, são necessárias algumas observações a título de premissa que foram por nós elaborada como parte de trabalho em curso de aperfeiçoamento.
A audiência una, com toda a produção de prova oral realizada de forma concentrada, só foi introduzida no Brasil recentemente através da Lei nº 11.719 de 20 de junho de 2008. Apesar de aspiração antiga, apenas no século vinte e um transformou-se em direito positivo e com aplicação generalizada.
Antes da Lei nº 11.719/2008, a audiência una já havia sido adotada de forma enfática em pelo menos dois procedimentos especiais: o dos Juizados Especiais Criminais e o da Lei Antitóxico.
Em verdade, antes desses procedimentos, o antigo "Processo Sumário" previsto no art. 531 e seguintes do Código de Processo Penal previa que, após o interrogatório do réu, seria marcada audiência de julgamento, momento em que, afora a produção de prova oral através de testemunhas, previa-se, no parágrafo segundo, do art. 538 do CPP, as alegações finais orais em audiência e prolatação da sentença também no mesmo ato.
Apesar da previsão normativa, a experiência do Foro informa, infelizmente, que passou a ser comum a cisão da audiência em vários atos, a concessão de prazo para alegações finais através de memoriais e raramente se proferia sentença em audiência. A constatação dessas falhas, não só no antigo "processo sumário", mas até mesmo no procedimento especialíssimo dos Juizados Especiais Criminais, demonstra que não basta a alteração legislativa se não vier acompanhada da conscientização de todos os atores do processo de sua importância, principalmente do juiz.
Na novel legislação, em respeito ao sistema acusatório, o interrogatório do acusado passou a ser o último ato antes das alegações finais orais, o que permite caracterizá-lo como meio de defesa, e exigiu-se como regra geral que o Juiz profira sentença em audiência tanto para o procedimento ordinário como para o sumário.

Principais vantagens da audiência una
A adoção da audiência una representa relevante simplificação procedimental, pois elimina atos desnecessários e não imprescindíveis e permite uma aceleração do procedimento. A doutrina especializada tem indicado a simplificação e aceleração com uma das principais características do procedimento na atualidade.
Os objetivos são, ao contrário, aqueles da aceleração e da simplificação, juntas e não separadas. Aceleração significa que a ordinária atividade cognitiva ( a defesa escrita, a eventual fase instrutória, a discussão oral) se desenvolva em um tempo razoável. Simplificação significa que, dado o percurso ordinário do processo, se procura eliminar todas as atividades repetitivas e não indispensáveis a um adequado tratamento. Tudo isso se soma a um terceiro, importante conceito, que é o da flexibilidade: a regra processual deve consentir a adaptação do rito às exigências de um bom tratamento do caso concreto.(Tradução nossa)

É importante rememorar que, na sistemática anterior, a instrução penal se desdobrava em, geralmente três audiências, a saber: de interrogatório, de testemunhas de acusação e de defesa, além do prazo para diligências e alegações finais que corriam em cartório. Após tudo isso, ainda era necessária a intimação da sentença quando proferida, gerando trabalho para a Secretaria, geralmente deficitária de pessoal, e muitas vezes dificuldades para se localizar as partes.
Na sistemática atual, a oralidade é prestigiada, embora não seja um procedimento oral puro que talvez não exista de forma absoluta em nenhum lugar do mundo, com a concentração dos atos processuais, o contato direto do Juiz com as provas e a imediatidade desse contato e do julgamento derivado desse contato. Por essas razões é que a identidade física do Juiz passou a ser prestigiada dogmaticamente pelo processo penal. Por essa razão, principalmente quando o registro dos atos e feito por meio de instrumento audiovisual, com sustentação no §1º do art. 405, do Código de Processo Penal, é que o Juiz deve proferir sentença em audiência em respeito, só não assim procedendo em casos especialíssimos. Relembre-se que as partes dirigirão suas indagações diretamente às testemunhas nos moldes do cross-examination.
É interessante ressaltar que mesmo que haja eventualmente necessidade de cindir-se a audiência, deve o magistrado ouvir todas as testemunhas que comparecerem e zelar para que na última audiência, ou em sua última parte, seja realizado o interrogatório, oferecidas alegações finais e prolatada a sentença.
Na esteira do que vem se defendido até este instante, não se pode deixar de registrar que a prolatação de sentença em audiência torna o processo jurídico mais transparante e permite à vítima, ao acusado, às testemunhas e aos cidadãos em geral que estiverem no Forum saber o resultado dos processos penais, que podem, por evidente, ou absolver ou condenar.
Na sistemática anterior, os atos cindidos se arrastavam por anos e por diversas vezes foi possível observar que as três ou, no mínimo duas, audiências eram realizadas por juízes diferentes e sentença, quando de não reconhecimento da prescrição, era proferida por um terceiro magistrado. Não era possível aos juízes muitas vezes verem o resultado do processo em que oficiaram! Imagine-se para o cidadão em geral.

Audiência una: perspectivas de futuro
Pensamos que no atual momento em que do Judiciário cada vez mais são cobrados resultados, a sistemática da audiência una se constitui em importante instrumento de resposta às demandas crescentes. Mas não é só. Ela confere visibilidade, transparência e permite uma maior gestão processual em face da concentração dos atos.
Apesar dessas vantagens, entendemos que é preciso mais investimento nos instrumentos de registro de ato processuais tanto presenciais como por teleconferência para que eles sejam preservados em ambientes seguros, de preferência como aplicativo do próprio programa utilizado para movimentação dos feitos.
Também e principalmente necessário que os atores processuais compreendam a nova sistemática e não quebrem a oralidade dos atos nem unicidade da audiência por conveniências menores.
Considerando que os acusado foram citados, havendo a Lei concedido à Defesa o prazo de dez dias para manifestação, bem como que a prova oral produzida em audiência não se mostrou complexa nem fez referências a vários outros fatos, afora os noticiados na fase policial, não há complexidade, afora a eventualmente existente desde a citação dos acusados. Considerando que a Defesa, quando de sua manifestação por escrito, nada alegou, nem requereu a produção de prova técnica, por exemplo, bem como que as provas que foram produzidas desde a fase de inquérito apresentam-se de forma muito clara, indefiro o pedido de apresentação das alegações finais por meio de memoriais.
Registre-se que se o Juiz tiver a postura de sempre remeter as alegações finais para memoriais escritos irá comprometer os dois principais objetivos da reforma recente das leis processuais penais: a oralidade com a concentração dos atos processuais e a celeridade, transformando-se este procedimento no antigo "processo ordinário escrito'.
Em seguida foi concedida a palavra ao advogado Dr. Francisco Josmário de Oliveira Silva que se manifestou nos seguintes termos:

Nenhum comentário: