A notícia é a seguinte:
O ex-reitor da Universidade de Brasília (UnB), Timothy Mulholland, entrou com um pedido de Habeas Corpus no Superior Tribunal de Justiça que pode definir questão candente em termos de processo penal e direito de defesa: o Ministério Público pode se manifestar depois da defesa preliminar do denunciado? A resposta será dada pela 5ª Turma do STJ.
Mulholland foi denunciado por crime de peculato (duas vezes) e formação de quadrilha. Os advogados do ex-reitor ofereceram a defesa preliminar e depositaram garantias em juízo. O juiz, então, notificou o Ministério Público para se manifestar sobre a resposta da defesa. No pedido de Habeas Corpus, o ex-reitor afirma que a manifestação do MP, nestes casos, é inconstitucional e fere o devido processo legal. O ministro Arnaldo Esteves, relator do caso no STJ, indeferiu pedido de liminar para suspender o curso da denúncia. Depois de parecer do MP, o mérito será julgado pela 5ª Turma.
Segundo os advogados do ex-reitor, a resposta do MP inviabiliza o pedido da defesa, no qual se busca preservar seu direito de se manifestar após a acusação. “O Ministério Público, ao falar por último nos autos, ignorou a lógica processual penal que resguarda a possibilidade de a defesa por último se manifestar”, sustentam Frederico Donati Barbosa, Aldo de Campos Costa, Marcelo Turbay Freiria, Conrado Donati Antunes e Mayra Cotta Cardozo de Souza, que assinam o pedido de HC —clique aqui para ler a íntegra do pedido.
“Se a defesa tivesse a inequívoca certeza de que o Ministério Público seria chamado para autêntica réplica, talvez a melhor estratégia fosse outra, postergando a arguição dos vícios da denúncia e da investigação”, afirmam.
A questão gira em torno do artigo 514 do Código de Processo Penal. De acordo com o dispositivo, “nos crimes afiançáveis, estando a denúncia ou queixa em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do acusado, para responder por escrito, dentro do prazo de quinze dias”. Ou seja, antes de decidir se recebe a denúncia, o juiz permite a manifestação do denunciado. Advogados reclamam que, na prática, essa defesa prévia está ajudando o MP a corrigir falhas nas denúncias. O que fere o direito à ampla defesa.
Timothy Mulholland recorreu ao STJ porque em primeira e segunda instância os juízes consideraram que a réplica do Ministério Público não afronta a garantia da ampla defesa. Para o juiz de primeiro grau, o pronunciamento do MP “após a fase do art. 514 do CPP, mas antes de analisada a denúncia já oferecida, não enseja prejuízo aos denunciados, a quem, igualmente, já se garantiu amplo exercício do direito de defesa”. O entendimento foi mantido pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região.
No pedido ao STJ, os advogados apontam para a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a defesa tem o direito de, sempre, usar a palavra por último — e elencam votos de ministros como Marco Aurélio e Menezes Direito para corroborar a tese. Sustentam, ainda, que não é necessário demonstrar o prejuízo da parte nos casos de nulidade absoluta, como na ofensa ao devido processo legal.
A defesa de Mulholland pede o desentranhamento da manifestação do Ministério Público, feita após a defesa preliminar, ou que seja facultado ao denunciado o direito de responder à réplica do MP.
Timothy Mulholland renunciou ao cargo de reitor da UnB depois de começar a ser investigado por mau uso de dinheiro da Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec). O ex-reitor é acusado de comprar mobiliário de luxo com recursos da fundação para o seu apartamento funcional. O Ministério Público Federal no Distrito Federal e o Ministério Público do DF entraram na Justiça com ação de improbidade administrativa contra o ex-reitor.
Comento:
A questão é interessante, mas, depois da reforma, acredito que ficou mais fácil de responder.
Na prática judiciária, aplico subsidiariamente o art. 409, CPP, do procedimento do tribunal do júri, que prevê a possibilidade de audiência do Ministério Público depois da defesa do acusado.
Veja que o procedimento ordinário não tem previsão desta audiência do Ministério Público por falta de técnica legislativa. O procedimento especial do art. 514 deve então receber uma leitura constitucional, adequada à paridade de armas.
A audiência do Ministério Público atende ao princípio da paridade de armas. Agora, também em razão deste princípio, quando se determina a audiência do Ministério Público, é preciso abrir nova vista à defesa.
Assim entendo.
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