Depois
da segunda leitura da parte geral e de uma leitura menos detalhada na parte
especial, avalio positivamente o Projeto de Reforma do Código Penal..
Houve
pecados e vantagens.
A
falha mais séria da Parte Especial está nos crimes contra ordem
tributária/previdência. O projeto mostrou sua “falsa cara garantista” e também
a nossa incapacidade de punir os crimes que atingem esses interesses
financeiros do Estado.
Na
prática, não precisa ser especialista para saber que as novas medidas
protecionistas sepultam o controle da criminalidade tributária/previdência. Não
apenas por causa da suspensão do processo, em qualquer fase, caso o devedor
apresente caução que assegure quitação. Não é isso. O §. 8º do art. 348 do Projeto praticamente libera a fraude tributária até
R$ 20 mil. Nos crimes contra a ordem tributária e a previdência social, não haverá
crime se o valor correspondente à lesão for inferior àquele usado pela Fazenda
Pública para a execução fiscal. Como atualmente a administração não processa a
cobrança dos débitos de até R$ 20 mil, até este valor não há incidência do tipo
penal.
Vejamos
o texto do citado §:
Causa
de exclusão de tipicidade
...
§
8º Não há crime se o valor correspondente à lesão for inferior àquele usado
pela Fazenda Pública para a execução fiscal.
O
crime de corrupção não está entre os crimes hediondos. Os relatores do projeto não
percebem a vitimização secundária que este delito provoca? Perceberam sim, mas certamente
sabiam que uma tal medida não passaria no Congresso.
Pelo
projeto, são Crimes Hediondos:
Art. 56. São considerados hediondos os
seguintes crimes, consumados ou tentados: I - homicídio qualificado, salvo
quando também privilegiado; II – latrocínio; III - extorsão qualificada pela
morte; IV - extorsão mediante sequestro; V - estupro e estupro de vulnerável;
VII - epidemia com resultado morte; VIII – falsificação de medicamentos; IX -
redução à condição análoga à de escravo; X – tortura; XI – terrorismo; XII –
tráfico de drogas, salvo se o agente for primário, de bons antecedentes, e não
se dedicar à atividades criminosas, nem integrar associação ou organização
criminosa de qualquer tipo. XIII – financiamento ao tráfico de drogas; XIV -
racismo XV – tráfico de pessoas; XVI – crimes contra a humanidade.
§ 1º A pena por crime hediondo será
cumprida inicialmente em regime fechado.
§ 2º Os crimes hediondos são
insuscetíveis de fiança, anistia e graça.
Apesar
disso, a proposta dá uma guinada no tratamento dos crimes praticados por
agentes públicos. Cria várias hipóteses de condutas criminalizantes e aumento o
rigor das penas. Ao considerar que constitui abuso de autoridade exceder-se sem
justa causa no cumprimento de qualquer diligência, vejo que o projeto crime conduta
de muita abrangência. É crime submeter o uso de algemas quando não oferecida
resistência e houver perigo a integridade de outrem.
Abuso de autoridade
Art. 271. Constituem
abuso de autoridade as seguintes condutas de servidor público, se não forem
elemento de crime mais grave: I – ordenar ou executar prisão, fora das
hipóteses legais; II – constranger qualquer pessoa, sob ameaça de prisão ou
outro ato administrativo ou judicial, a fazer o que a lei não exige ou deixar
de fazer o que a lei não proíbe; III – retardar ou deixar de praticar ato,
previsto em lei ou fixado em decisão judicial, relacionado à prisão de qualquer
pessoa; IV – deixar injustificadamente de conceder ao preso qualquer direito se
atendidas as condições legais para sua concessão; V – submeter
injustificadamente qualquer pessoa sob sua custódia ou não, durante diligência
ou não, a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei; VI – submeter
injustificadamente preso ou investigado ao uso de algemas quando ele não
oferecer resistência à prisão e não expuser a perigo a integridade física de outrem;
VII – invadir, entrar ou permanecer em casa ou estabelecimento alheio, ou em
suas dependências, contra a vontade de quem de direito, sem autorização
judicial ou fora das hipóteses legais; VIII – proceder à obtenção de provas ou
fontes de provas destinadas a processo judicial ou administrativo por meios não
autorizados em lei; IX – expor injustificadamente a intimidade ou a vida
privada de qualquer pessoa sem justa causa ou fora das hipóteses legais; X –
exceder-se sem justa causa no cumprimento de qualquer diligência; ou XI – coibir, dificultar ou impedir reunião,
associação ou agrupamento pacífico de pessoas, injustificadamente, para fim não
proibido por lei: Pena – prisão, de dois a cinco anos. Parágrafo único. É
efeito da condenação a perda do cargo, mandato ou função, quando declarada
motivadamente na sentença, independentemente da pena aplicada.
No
tocante aos crimes patrimoniais, a Reforma do Codigo Penal não ignorou os 65
mil presos por furto que existem no País. Seguiu na direção de desencarcerizar
condutas simples e penalizar as mais graves. Correto. O roubo simples teve a
pena reduzida para três a seis anos. Atualmente a pena é de quatro a dez anos.
Dentre
outras muitas inovações (depois trataremos delas), tem uma que será especialmente
boa aos estudantes. O projeto libera as cópias integrais de livros, CDs e DVDs,
para uso próprio e sem fins comerciais.
Seguindo
a tendência crítica dos doutrinadores, a Comissão propôs a revogação da lei de
contravenções.
Ainda
falta considerar a parte geral. Aqui também se encontram muitas novidades. Até
breve.
Fábio
Ataíde
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